quarta-feira, 10 de outubro de 2012

A ARTE DE FAZER POLÍTICA DE VERDADE

Desculpem a bagunça, mas não consegui diminuir o suficiente para caber e não podia deixar de publicar. Podem ver a reportagem de melhor forma acessando http://www.defato.com/noticias/7332/comentada

Amanda Gurgel avisa: ‘Vão ter que nos engolir em grande estilo’

Frankie Marcone
'Vai ser um mandato intenso, de luta incansável', diz Gurgel
Fábio Araújo / Da Redação Natal
Ela pertence ao PSTU, um partido pequeno, conhecido por não abrir mão de seus rígidos princípios ideológicos em nome do crescimento numérico. Mesmo assim, a professora Amanda Gurgel, 31 anos, transformou-se na vereadora mais votada do Brasil, em termos proporcionais, com 32.819 votos, o equivalente a 8,59% do total. Em números absolutos, houve apenas candidatos em São Paulo, Rio de Janeiro e Fortaleza com votação superior. Ela é também a vereadora mais votada da história de Natal.
O fenômeno começou a ser desenhado em maio do ano passado, quando seu pronunciamento em defesa da educação, durante audiência pública na Assembleia Legislativa, virou febre nacional no Youtube e recebeu 2,2 milhões de acessos desde então. Estava plantada a semente para a professora de Língua Portuguesa das escolas Amadeu Araújo (estadual) e Mirim Coelli (municipal) deixar o anonimato e se transformar em celebridade.
Com uma campanha modesta, que recusou doações de empresários e contabiliza até agora gastos de R$ 65 mil, devendo chegar a R$ 75 mil no total, Amanda teve votos suficientes para eleger mais dois vereadores da sua coligação, Sandro Pimentel e Marcos do PSOL, que receberam respectivamente, 1.398 e 717 votos. Boa parte da sua agenda na segunda-feira (8) foi dedicada a atender aos pedidos de entrevista os jornalistas locais e nacionais. Saiba mais sobre quem é e o que pensa Amanda Gurgel nessa entrevista concedida a três órgãos de imprensa.
Professora, sua votação foi surpreendente?
Foi surpreendente para todo mundo. O PSTU é um partido pequeno, que nunca conseguiu eleger um parlamentar em Natal e que há muito tempo não elegia em nenhuma cidade do país. A gente saiu super vitorioso, com essa votação expressiva de quase 33 mil votos. Estamos muito felizes com isso.
Até que ponto aquele vídeo postado na Internet influenciou na sua votação?
O vídeo não apenas influenciou, ele foi o gerador disso tudo que aconteceu comigo. Antes do vídeo, eu sempre atuei nas lutas, nos movimentos estudantil e sindical, mas nunca tinha me passado pela cabeça ser candidata a vereadora, ter esse tipo de atuação. A partir da repercussão do vídeo é que existe uma reivindicação por parte dos meus colegas de trabalho e dos meus conhecidos na rua, no sentido de me candidatar. Então o vídeo influenciou sim nessa votação, tanto para o fato de eu ter me tornado conhecida nacionalmente, quanto pelo próprio conteúdo, que é de denúncia, de reivindicação, exatamente o que as pessoas esperam do meu mandato. Um mandato que lute pela saúde pública, pela educação pública, pelo transporte público. Sem dúvida, o vídeo foi preponderante.
Como a senhora avalia o significado político dessa votação? O que ela mostra sobre a cidade de Natal neste momento?
O balanço político é o que a gente vinha dizendo ao longo da campanha: ‘chega dessa velha política, chega!’. Acho que as pessoas aos poucos se convencem disso e o que acontece nessa eleição é um recado que a população passa. ‘Chega, não queremos mais mandatos hereditários, mandatos dominados pelos empresários’. A gente vê que existe na verdade uma onda dessa mudança. A própria votação de Robério, apesar de ser um percentual pequeno, é considerável se levarmos em conta a estrutura das outras candidaturas. Inclusive os outros candidatos são mais conhecidos e já têm um histórico político na cidade. Então é uma onda, as pessoas dizendo ‘basta’. Conseguimos eleger um outro vereador do PSTU, em Belém. É o sentimento de mudança.

As urnas trouxeram outro recado: a senhora levou para a Câmara Municipal dois vereadores que a priori não teriam condição de chegar lá sem seus votos. Como a senhora avalia esse tipo de mudança que sua candidatura trouxe para a Casa?
A votação de Sandro e de Marcos não foi expressiva, certamente eles não entrariam se não fosse por mim, e eu fico feliz com o fato de ter contribuído para que mais duas cadeiras da Câmara não sejam ocupadas pelos velhos partidos, pelos velhos políticos. Fico feliz de minha candidatura ser um símbolo ou um reflexo desse desejo de mudança por parte das pessoas, e que seja também responsável por isso: desorganizar o que era previamente organizado. A CMN sempre foi loteada, dividida, tantas vagas para tal coligação. Esse cálculo já era feito previamente e, agora, ficou tudo um pouco em desajuste. Ninguém esperava ter três vereadores da Frente Ampla de Esquerda. E vão ter nos engolir. Vão ter que nos engolir em grande estilo, porque não é qualquer coisa. Nós levamos conosco mais de 33 mil votos. E são essas pessoas que nós vamos representar. Como ainda não me reuni com Sandro e Marcos, vou falar por mim. Não serei submissa, não serei capacho do Poder Executivo.
Será uma atuação radical?
Olha, sinceramente, as pessoas dão esse adjetivo ao nosso partido, que seria radical. Na minha concepção, acho que a sociedade é muito radical com os trabalhadores. A sociedade mata os trabalhadores. Os políticos matam os trabalhadores na fila do hospital, mas ninguém diz que eles são radicais por causa disso. Os políticos colocam os trabalhadores imprensados numa lata de sardinha para se locomover, mas ninguém diz que o Seturn é radical. Agora, porque a gente tem a coragem de fazer denúncias reais, que fazem parte do nosso cotidiano, então nós somos radicais? Não sei, depende do conceito de cada um. Se ser radical é se colocar ao lado dos trabalhadores, é defender intransigentemente os serviços públicos, a saúde, a educação, o transporte, o saneamento, o calçamento das ruas, então certamente será um mandato radical.
Qual será sua postura no segundo turno das eleições de Natal?
Nós ainda não discutimos nada sobre isso, até porque o anúncio do segundo turno está muito recente. Mas pelo nosso acúmulo de debates, nossa trajetória política, todo mundo sabe que o PSTU jamais se aliará a qualquer um desses partidos. São candidatos e partidos que sempre compuseram os governos do Estado e da cidade. Então não temos nenhum motivo para admitir qualquer mudança na atuação deles que aponte para um apoio nosso. Não existe. São partidos que nunca defenderam os trabalhadores, nunca se comprometeram com a educação nem com a saúde. Não vejo motivo para que a gente defenda um desses dois candidatos, apesar de não ter tido nenhuma discussão sobre isso. Seremos oposição, ganhe quem ganhar.
Qual foi o perfil básico do seu eleitor?
A gente ainda vai se debruçar sobre isso. Foi muita gente. A campanha foi comovente. Foi uma campanha em que muitos idosos se envolveram mesmo, de vir aqui ao comitê para pegar material e levar para sua rua, espontaneamente. Pessoas que nunca tiveram contato com o partido nem relação política. Recebemos doações de muita gente, tanto de colegas de trabalho que doaram R$ 50 por mês, quanto doações de familiares que deram mil reais. Essas foram as mais expressivas. Acho que a mais alta de todas foi uma de R$ 1,5 mil.
A senhora surge como a grande liderança do PSTU. Estaria com isso habilitada a ter uma projeção na eleição de 2014?
Boa pergunta. Naquele período do vídeo, já perguntavam se eu seria candidata a vereadora. Eu dei a resposta óbvia, que era ‘não discutimos esse assunto’, e acabaram transformando isso em ‘você disse que não ia se candidatar, e agora é candidata’. É importante corrigir isso, pois eu nunca afirmei que não seria candidata. Como também não vou dizer agora que não vou concorrer para deputada, porque eu não sei. Não discutimos isso. Até domingo não sabíamos nem se eu seria eleita vereadora.
Foi o deputado estadual Fernando Mineiro (PT) quem primeiro colocou o vídeo no site dele. Como a senhora avalia essa situação peculiar?
É algo inesperado, realmente. Ninguém esperava que ia ter essa repercussão, nem o próprio Mineiro. Ele já sabia que eu era do PSTU e me conhece há muito tempo, sabe que eu sou da oposição à direção do sindicato, que é do PT. Na oposição ao governo Rosalba, o PT obviamente utilizou o vídeo como instrumento. No formato em que estava no site de Mineiro não era possível compartilhar, então um professor me ligou pedindo autorização para colocar no Youtube, dizendo que era um instrumento da luta da categoria.
Qual será seu primeiro projeto quando chegar à Câmara?
O mais importante é deixar claro que eu, definitivamente, não vou ser uma vereadora como os que já estão lá. Nosso mandato não terá nada a ver com o que já foi construído até hoje na CMN e com o que provavelmente será pela maioria dos que foram eleitos agora. É um mandato comprometido com as lutas dos trabalhadores, de denúncia. Não haverá nada que aconteça de errado dentro da Câmara que não seja amplamente divulgado. Haverá campanhas para que os trabalhadores estejam conscientes e possam reagir aos ataques que venham lá de dentro. Como também será um mandato propositivo. Temos a defesa do investimento de 30% do orçamento do município para a Educação. Vamos levantar essa bandeira, que com certeza sofrerá muitos embates porque é um percentual muito alto. É alto sim, mas é tão grande quanto o problema que existe hoje na educação. Realmente, chegamos ao fundo do poço. Temos 35 mil crianças de 0 a 5 anos fora de creche. Temos professores terceirizados, que são contratados como Auxiliares de Serviços Gerais (ASGs), recebem salários mínimos, ainda passam três meses sem receber e lecionam nessa condição. Temos escolas sem professores e superlotadas, todo tipo de problema. Para resolver isso, precisa de mais investimento.
Como a senhora pretende articular a aprovação desse projeto de lei? Vai trabalhar internamente junto aos vereadores ou vai estimular a pressão externa?
Não tenho a menor ilusão quanto a ter apoio e alianças dentro da Câmara. Na campanha, ficou muito claro que o dever das pessoas não era só votar e pedir votos para mim, elas teriam também que construir o mandato. Não há outro jeito de aprovar esses projetos senão os próprios beneficiados por eles fazerem pressões nas ruas, dentro da Câmara, no momento da votação, para presenciar e ver de perto quem está votando a favor das pessoas. Vai ser um mandato intenso, de luta incansável em defesa dos trabalhadores e da juventude.
Um dos destaques do seu pronunciamento naquela audiência que gerou o vídeo foi o seu salário de três dígitos. Agora, a senhora vai ter salário de cinco dígitos. Como vai ser essa questão? A senhora acha que um vereador ganha muito bem? O salário vai ser repartido com o seu partido?
O salário do vereador (R$ 15.017) é absurdo em relação ao salário de um professor. É suficiente para pagar o salário de quase treze professores da rede municipal. Essa discrepância é inadmissível, um absurdo que não tem tamanho. Então, obviamente, por uma questão de coerência, eu jamais pegaria nesse salário de vereadora, que não vai entrar no meu bolso. Desse salário, eu vou tirar o meu salário de professora, que a partir daquela greve é o piso nacional de R$ 1451 na rede estadual. No município, não recebemos o piso e o salário inicial é de R$ 1212. Eu recebo a soma dos dois, pois trabalho nas duas redes. Meu salário de vereadora vai ser gerenciado pelo próprio mandato e pelo partido, e direcionado para a construção das lutas dos trabalhadores, para a impressão de material, inclusive livros. O que a gente achar interessante para a formação política.

Veja abaixo vídeo da entrevista com Amanda Gurgel:

http://www.defato.com/noticias/7332/comentada

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